segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Balada na madrugada

Tudo o que você fizer no primeiro dia do ano novo você continuará fazendo pelo ano inteiro, profetizava a minha vó Bel.

Por conta dessa crença, a virada do ano na minha infância era cheia de rituais. Meus pais garantiam que eu arrumasse a cama e limpasse o quarto. Eu fazia questão de andar no balanço, nadar na piscina, andar de bicicleta e, claro, assistir o máximo possível de televisão.

Se tudo acontecer como diz a crença, posso garantir que o ano nesta Ilha Maternália será intenso. Ficamos acordados madrugada adentro e passeamos muito de carro.

Farra? Não. Gandaia? Também não. Balada de reveillón? Definitivamente não.

É que Matias ficou doente bem às vésperas do ano novo.

Tudo começou com um espirro depois do Natal. E outro. E mais outro. O que parecia ser uma simples gripe se transformou em calvário.

Matias ficou muito congestionado. Parou de comer, de tomar leite, e não conseguia dormir. Então veio a febre. O calor saariano desta época do ano não ajudava em nada. Era impossível baixar sua temperatura, mesmo com antitérmico e banho. Matias estava apenas de fralda e, ainda assim, podíamos fritar um ovo em sua testa.

Mesmo à noite, os ventiladores só serviam para circular o bafo quente do ar.

Matias chorava.  Ele precisava de um lugar fresco, ou com ar condicionado, para ajudá-lo a respirar. Ele precisava comer algo, qualquer coisa.  Ele precisava dormir, nem que fosse sentado.

Diante de quadro tão desesperador, encontramos uma solução típica de pais de primeira viagem: saímos para uma volta de carro.

É incrível o poder que um carro pode ter para acalmar um bebê. Depois de algumas quadras, o choro passou. Matias bebeu um pouco de água e comeu algumas colheradas de uma papinha de frutas. Depois de quinze minutos, adormeceu profundamente.

As ruas de São Paulo estavam vazias. Eu e Torero não queríamos voltar logo para casa e correr o risco de Matias acordar e do desconforto voltar. Então percorremos a cidade de carro por algumas horas enquanto ele dormia. Vimos as decorações de Natal na Paulista e no Ibirapuera. Passamos em um Drive-Thru e lanchamos ao som de Marisa Monte, circulando de carro pela Praça Benedito Calixto. Voltamos para casa em plena madrugada.

Nossa balada piorou assim que chegamos. A febre de Matias bateu nos 40º C. E, na tentativa de banho para baixá-la, veio o primeiro delírio. Matias ficou branco como papel, falou tudo enrolado e vomitou.

Pânico. Corremos para o PS. Torero dirigiu como Jason Bourne em seu pior momento de perseguição. Às seis e meia da manhã da véspera de Ano Novo, Matias era atendido no hospital e uma batelada de exames começou. Resultado? Uma mega infecção das vias aéreas superiores, mas ainda sem pneumonia.

Na volta para casa, inalação, soro, antitérmico e o temido antibiótico tiveram que ser administrados.
Há algumas horas do réveillon, nós três estávamos um caco. Matias, pelas razões óbvias. Eu e Torero pela falta de sono e cansaço.

2015 chegou, e com ele veio outra noite em claro.  Matias não conseguia achar posição para dormir e apelamos de novo para a volta de carro. Mais uma noite adentro pela São Paulo iluminada. Mais um nascer do sol assistido.

Tudo o que você fizer no primeiro dia do ano novo você continuará fazendo pelo ano inteiro. Se a crença de minha avó estiver certa, não há dúvidas do que eu e Torero faremos durante todo o ano: viveremos as aventuras e desventuras de sermos pais.


P.S: Depois de 15 dias pós antibiótico, Matias finalmente ficou bem.

Só depois que Matias já estava bem é que conseguimos celebrar nosso ano novo